Ainda recentemente, no filme Homens Brancos Não Podem Enterrar (White Men Can't Jump), de 1992, de Ron Shelton, durante um jogo de basquete, um negro, aplaudindo uma grande jogada grita: "Uma coisa bela é um prazer eterno - John Leats disse isso, cara!"
Filme algum, no entanto, deu à poesia destaque de tal importância quanto Sociedade dos Poetas Mortos (Dead Poet Society) de Peter Weir. O filme, que se passa no fim da era Eisenhower, em 1959, faz do ensino de literatura uma metáfora da libertação espiritual e leva o professor-herói, vivido por Robin Williams, a sugerir que seus alunos, de uma escola particular da Nova Inglaterra, a ele se dirijam por meio de uma exortação de Walt Whitman.
Na fita de Woody Allen Ana e Suas Irmãs (Hannah and Her Sisters), Michael Caine compra para sua cunhada (Barbara Hershey) os poemas completos de e.e.cummings, como prova de apreço e instrumento de sedução, chamando a atenção da cunhada para o poema: "Seu olhar mais leve facilmente/ me abrirá/ Conquanto eu tenha me fechado/ como dedos/ A mim você sempre abre pétala por pétala."
Ao longo da história do cinema, muitos tentaram escrever diálogos poéticos originais. Nos muitos roteiros que escreveu para Marcel Carné e Jean Renoir, o poeta Jacques Prévert usou e abusou da tentação. Revendo hoje as fitas do chamado cinema clássico francês, anos 30 e 40, como, só para citar um exemplo, Os Visitante da Noite (Les Visiteurs du Soir) de Carné, com roteiro de Prévert, uma alegoria pesadona e postiçamente sombria da França ocupada, chega-se ao fim atacado de logorréia, tal a avalanche de palavrório pseudopoético, sussurrado entre gestos artificiosos.
Os franceses, de Prévert a Godard, nunca perderam esse viés. É o único cinema em que as legendas chegam a ocupar três linhas da tela, tanto se fala no filme francês, frequentemente bobagem metida a poesia e filosofia, e que derretemos basbaques d'além-mar. Quem não se lembra de Lemmy Caution, interrogado pelo computador no Alphaville, de Godard: "Você sabe o que transforma a noite em luzes? A poesia."
Assef Kfouri é jornalista
Texto extraído de " Jornal da Tarde"
- CADERNO DE SÁBADO -
Data: - Sábado - 16-8-97
JORNAL DA TARDE - pertencia ao jornal " O ESTADO DE SÃO PAULO "
Na fita de Woody Allen Ana e Suas Irmãs (Hannah and Her Sisters), Michael Caine compra para sua cunhada (Barbara Hershey) os poemas completos de e.e.cummings, como prova de apreço e instrumento de sedução, chamando a atenção da cunhada para o poema: "Seu olhar mais leve facilmente/ me abrirá/ Conquanto eu tenha me fechado/ como dedos/ A mim você sempre abre pétala por pétala."
Ao longo da história do cinema, muitos tentaram escrever diálogos poéticos originais. Nos muitos roteiros que escreveu para Marcel Carné e Jean Renoir, o poeta Jacques Prévert usou e abusou da tentação. Revendo hoje as fitas do chamado cinema clássico francês, anos 30 e 40, como, só para citar um exemplo, Os Visitante da Noite (Les Visiteurs du Soir) de Carné, com roteiro de Prévert, uma alegoria pesadona e postiçamente sombria da França ocupada, chega-se ao fim atacado de logorréia, tal a avalanche de palavrório pseudopoético, sussurrado entre gestos artificiosos.
Os franceses, de Prévert a Godard, nunca perderam esse viés. É o único cinema em que as legendas chegam a ocupar três linhas da tela, tanto se fala no filme francês, frequentemente bobagem metida a poesia e filosofia, e que derretemos basbaques d'além-mar. Quem não se lembra de Lemmy Caution, interrogado pelo computador no Alphaville, de Godard: "Você sabe o que transforma a noite em luzes? A poesia."
Assef Kfouri é jornalista
Texto extraído de " Jornal da Tarde"
- CADERNO DE SÁBADO -
Data: - Sábado - 16-8-97
JORNAL DA TARDE - pertencia ao jornal " O ESTADO DE SÃO PAULO "
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